Em 2003, há pouco mais de uma década, eu tive o prazer e a oportunidade de entrevistar o cientista Nicholas Negroponte para a – então principal publicação de gestão educacional da América Latina – Revista @prender.
A @aprender havia sido fundada poucas edições antes por Ryon Braga que a tinha como uma das estratégias e importante marca da Hoper Educacional.
Durante alguns anos e algumas mudanças editoriais coube a revista à missão de falar a árida língua da gestão para os, então, sensíveis ouvidos de uma audiência majoritariamente acadêmica, e a mim, o exercício de todos os meses produzir artigos e ensaios sobre marketing educacional, uma personagem não grata e alienígena nas então “assessorias de comunicação” encasteladas nas reitorias de todo o país.
Há pouco mais de dez anos, conseguir uma entrevista com Negroponte foi o ápice da minha carreira de estagiário, iniciando o segundo ano do curso de jornalismo.
Nicholas Negroponte era, na ocasião, porta voz das TICs tendo ha não muitos anos participado da criação da Revista Wired. Estava elevado no mainstream ao mesmo status de Drucker e Kotler como um dos gurus da segunda metade do século XX.
A minha pergunta de aquecimento, que abriu uma torrente de questionamentos sobre educação, acabou sendo aquela cuja resposta mais me impressionaria e que, provavelmente, me assombrará por toda a vida.
Pedi ao, então reconhecido criador e presidente de honra do Media Lab do MIT (Massachusetts Institute of Technology) que “apenas por uma abstração” se ele “poderia projetar uma cronologia das principais inovações / revoluções das 5 décadas vindouras”. Transcrevo a resposta abaixo:
“Até 2010 teremos em todos os lugares computadores operando com banda larga e sem fios ou cabos (wireless). Até 2020 a tradução da linguagem será tão boa e natural quando a do próprio ser humano. Até 2030 existirão implantes no cérebro e no corpo para comunicação direta e argumentação com os computadores. Até 2040 iremos fazer arquivos de mentes (downloads) para a imortalidade. Até 2050 iremos tele transportar objetos físicos”
Em 2003 (o Google ainda tinha 5 anos de idade) aquele que seria o criador da One Laptop per Child Association, anteviu que viveríamos em um mundo hiperconectado por uma malha de banda larga wifi, onde hotspots estariam em nossos corpos nos conectando a internet em todos os lugares. Hoje, todas as vezes que saio a rua e munido de meu smartphone, tablet e laptop (as vezes juntos em minha mochila) ou observo meus contemporâneos em uma sala de espera imersos na world wide web, penso o quanto aquele senhor estava correto em sua primeira previsão.
Estamos chegando ao limiar de seu segundo acerto e é sobre ele que trata, na realidade, esse ensaio. Em 20 anos, teríamos segundo as runas do cientista, “tradução simultânea em tempo real”. Este, na ocasião, me pareceu o menos excitante dos seus prenúncios.
Na ocasião fiquei feliz em saber que nos próximos 20 anos (como pareciam distantes) teria um dispositivo em mim (um headphone, talvez, ou um colar segundo a Logbar http://logbar.jp/ ) que me traduziria para interlocutores de qualquer naturalidade sem precisar ter estudado sua língua que, na contramão, me entenderiam em bom português.
Nos anos que se passaram acompanhei de perto as evoluções, melhorias e versões de sistemas de tradução como o Babilon e o Google, que ano após ano traduziam com mais fidelidade textos em diversas línguas. Nem por isso fui relapso ao aprendizado de uma segunda língua. O fato é que – recentemente – a evolução de uma nova linha tecnológica (os dispositivos de reconhecimento de voz), e uma terceira (os aplicativos para smartphones) nos levaram muito perto do pressentido há 13 anos. Programas como Jibbigo Tradutor, S Tradutor, Verbalizeit e Lexifone permitem que nos façamos entender em dezenas de idiomas e tendem a melhorar – muito – em pouco tempo (eu estaria preocupado com o médio prazo se dirigisse uma rede de escolas de Inglês, por exemplo).
Ainda assim, pouco tempo é muito em um mundo dinâmico como o que vivemos. Entre a criação dessas novas tecnologias e sua popularização existe um prazo inaceitável. O fato é que em no universo on line, o português é uma ilha, um beco sem saída. Apenas 4% da internet é redigida em língua portuguesa, a pequenina ponta de um enorme iceberg.
Segundo levantamento feito pelo British Council, apenas 5% da nossa população sabe falar inglês.
Então vivemos o excitante limiar de modelos e a ameaça de um novo entrante no médio prazo.
Entrevistá-lo foi uma grande experiência e a obsolescência foi um dos temas que tratamos em outros momentos, em 2004, em nossa conversa:
Rafael – “Como as universidades podem preparar seus alunos para atuar no mercado de trabalho do futuro? Como prever essas mudanças de paradigma que chegam em grande velocidade”?
Negroponte – “Prepará-los para ficarem mais interessados, mais rápidos e se tornarem melhor aprendizes. A idéia de ‘aprender a aprender’ foi repetida à exaustão e atingiu um status de clichê. Mesmo assim continua sendo 100% correta”.
Rafael – “Qual o perfil e o papel do professor no futuro”?
Negroponte – “Se você olhar o ‘ensinar’ o bom professor sabe mais sobre as pessoas do que sobre a matéria que ensina. Olhando para sua própria educação, os melhores professores que você já teve foram aqueles que sabiam quem era você e não matemática e história. Eles sabiam como achar o nível de exigência ideal para que o ensino da sua disciplina não se tornasse frustrante. Nem muito difícil, nem muito fácil, ou chato. Para muitos de nós essa janela é muito pequena”.
Rafael – “Existe um limite para o conhecimento. Se existe um limite para a capacidade de processamento dos computadores, o final da Lei de Moore, para onde o ser humano irá evoluir quando as máquinas esgotarem”? Negroponte – “Conhecimento é como as galáxias: inesgotável. Computadores, em contraste, irão atingir o limite da Lei de Moore, na proporção que atingirmos o tamanho dos átomos e a velocidade da luz. Até isso começar a acontecer, acharemos novos modelos de engenharia fundamentalmente paralelos e descentralizados, e biológicos em sua natureza. Daí uma nova classe de máquinas moleculares mudarão as paisagens nos próximos 20 anos e serão ilimitadas nos próximos 200”.