Binge em inglês é exagero, farra, excesso. Como o termo recentemente se popularizou em função da mudança cultural perpetrada pelo Netflix, uma segunda tradução livre possível seria “maratona”. Isso porque a expressão binge watching batiza a mania de muitos usuários desse serviço: assistir na sequencia temporadas inteiras de seus seriados favoritos (habito, no Brasil, chamado “maratona”).
O acesso a esses conteúdos de acordo com a Harris Interactive, empresa de pesquisa responsável por um levantamento sobre a prática, aumentou com a venda de séries em DVDs, mas virou um aspecto cultural dominante nas novas gerações, em função da escalada da internet de banda larga. A internet mais rápida, que representava 10% da rede em 2008 e 21% em 2013, permitiu o download de arquivos mais pesados como filmes e a publicação desses arquivos em formato de torrent (um sistema que possibilita a fragmentação de filmes em formatos menores e o intercâmbio desses arquivos mais leves entre diversos usuários).
O modelo televisivo sacramentado de um episódio por semana, financiado por cinco intervalos comerciais com até 10 anunciantes por intervalo investindo cifras imensuráveis, pode estar perto da extinção. Sabe-se que a produção de um capítulo de novela no Brasil custa aproximadamente um milhão de reais e muitos protagonistas de séries ganham isso por episódio.
As estatísticas de acesso da própria Netflix já mostram a predileção por assistir episódios em sequência.
Mas sem os patrocinadores comerciais para bancar a festa como levar um produto como esses para o ponto de equilíbrio?
O presente artigo não pretende discutir o modelo de negócios cinematográfico e sua evolução e espírito de sobrevivência (uma indústria que sistematicamente se reinventou e sobreviveu as mais terríveis ameaças desde a chegada da televisão).
Nossa pretensão é somente criar uma reflexão sobre a mudança do binge watching na forma de consumir um produto cultural até então (e durante décadas) fragmentado. Em uma noite as novas gerações imergem e assistem uma temporada, que até então tinha um ano para ser monetizada capítulo por capítulo.
E assim é o paradigma atual da educação superior. O curso superior mais dinâmico é oferecido, atualmente, em torno de 24 meses ou 1600 horas. Um total de 2,2 horas por dia.
Um autodidata comprometido conseguiria em horário comercial concluir esse programa em pouco mais de cinco meses. Um binge learner daria conta em pouco mais de quatro meses.
E os binge learners já existem – há tempos – na educação.
Basta pensar nos produtos educacionais posicionados como “Intensivos” (ou “superintensivos”, no caso de preparatórios para vestibular ou concursos públicos).
Basta pensar nos intercâmbios onde os alunos passam dias e noites imersos em conversações em outros idiomas. Aceitamos binge learners de mestrado e douturado e não permitimos o estudo intensivo na graduação. E atendemos a um publico cada vez mais intolerante com a imposição de regras e acostumado com um tempo novo. Muitas vezes um tempo assíncrono.